Um tapete pistache, e sobre ele uma escrivaninha antiga, reformada e gasta. O som de uma máquina de escrever se fazia ouvir por todo o apartamento. Uma folha amassada voa pelo ar, bate no aro da lixeira e cai ao lado de muitas outras no chão.
Apaga o cigarro ansiosamente no cinzeiro, acende outro, toma o uísque misturado com a água derretida de dois cubos de gelo que havia colocado.
Levanta-se, abre a cortina e avista o céu, sem estrelas, sem lua, sem nada.
Vai até o rádio, coloca um vinil e curte Palo Seco. Volta à escrivaninha, coloca outra folha, ajusta novamente o parágrafo, só por hábito. Os dedos lutam contra as teclas já apagadas pelo uso. Pára. Nem um vislumbre de idéia lhe surge na cabeça. Vai à cozinha, abre a geladeira com certa dificuldade, a porta sempre emperrada.
Volta para sala, senta-se na poltrona velha de couro marrom, acende outro cigarro, dá três tragos e apaga-o. Dá uma olhada na folhinha de supermercado com o calendário daquele ano, marcado em vermelho, um xis com uma anotação ao lado: Prazo esgotado. Isso seria dali a dois dias.
Volta à máquina, pede por um clarão, mas até a noite escura parecia dizer que não cooperaria. Bate o pé direito no piso de taco acompanhando a melodia.
Pega um lápis, começa a rabiscar um papel, se torna mais interessado no guardanapo, lembra que o endereço daquela morena, que conheceu ontem no bar está ali. Rele o endereço, é perto, talvez passe lá mais tarde.
Sorri.
Tinha que entregar o texto daqui a dois dias e em mais de cinco horas não havia conseguido escrever um parágrafo se quer. Resolveu tomar um conhaque.
Acho que vou passar na casa do Fabinho. Toma o conhaque de um trago só.
Vai ao banheiro. Bate o pé no bidê. Xinga. Levanta a tampa do vaso. Não dá descarga. Pára em frente ao espelho, por que barba cresce tão rápido? Lava o rosto. Dá três tapinhas na bochecha. Ô, vida de cão.
Senta-se à escrivaninha novamente, e começa, sem muita inspiração:
Era um tapete na cor pistache.
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
Alguns versos
Dê-me uma folha de papel em branco
Deixe-me escrever uns toscos versos sobre mim
Deixe-me apresentar-me da maneira mais conveniente
Listar os livros que li, os quais não pude interpretar
As trilhas sonoras que embalaram minha vida.
Deixe-me entrar na sua vida
Talvez permita que faças parte da minha.
Maya Andrade
Deixe-me escrever uns toscos versos sobre mim
Deixe-me apresentar-me da maneira mais conveniente
Listar os livros que li, os quais não pude interpretar
As trilhas sonoras que embalaram minha vida.
Deixe-me entrar na sua vida
Talvez permita que faças parte da minha.
Maya Andrade
Furtivo
Que sorriso furtivo é este
que me rompe os ânimos
e perturba minha alma?
Que me confunde e instiga?
De que lugar ecoa essa rouquidão
que me afaga os ouvidos
e apascenta meus instintos?
Quem é este que inspira…
Por quais labirintos o encontrarei?
Que monstros marinhos terei que enfrentar?
Por qual arte ilusionista me ludibria
para que sua sombra se projete em mim
e se antecipe aos meus passos?
Como seguir àquele que é só presença…
Maya Andrade
que me rompe os ânimos
e perturba minha alma?
Que me confunde e instiga?
De que lugar ecoa essa rouquidão
que me afaga os ouvidos
e apascenta meus instintos?
Quem é este que inspira…
Por quais labirintos o encontrarei?
Que monstros marinhos terei que enfrentar?
Por qual arte ilusionista me ludibria
para que sua sombra se projete em mim
e se antecipe aos meus passos?
Como seguir àquele que é só presença…
Maya Andrade
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
"nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa
ou se quiseres me ver fechado,eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade:cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas "
e.e. cummings
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa
ou se quiseres me ver fechado,eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade:cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas "
e.e. cummings
Espaço
"Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. quando essa não-palavra - a entrelinha - morde a isca, alguma coisa se escreveu."
Clarice Lispector
Letras que emocionam,
que deixam falar as entrelinhas
e nos prendem entre os braços e nos aquietam.
Entre linhas o silêncio cala alto
Nos afaga
e nos faz repousar
a
Poesia.
Maya Andrade
Clarice Lispector
Letras que emocionam,
que deixam falar as entrelinhas
e nos prendem entre os braços e nos aquietam.
Entre linhas o silêncio cala alto
Nos afaga
e nos faz repousar
a
Poesia.
Maya Andrade
terça-feira, 22 de setembro de 2009
A margem.
Era outra e não esta que se vê.
Esta que nos muros se encosta como apoio.
Era outra.
Era aquela que nos textos era espaço.
Era outra.
Que mudança é esta que já não posso apalpar?
Não quero a outra.
Mas como dizer outra
se não posso dizer com exatidão onde está a margem do rio que fui?
Esta que nos muros se encosta como apoio.
Era outra.
Era aquela que nos textos era espaço.
Era outra.
Que mudança é esta que já não posso apalpar?
Não quero a outra.
Mas como dizer outra
se não posso dizer com exatidão onde está a margem do rio que fui?
Quero esta.
Amo antes a tela do que a imagem que nela é produzida.
Amo antes a tela do que o que nela possa se pintar.
Amo antes a tela do que a imagem que nela é produzida.
Amo antes a tela do que o que nela possa se pintar.
Sou tinta.
Maya Andrade
O retorno.
Depois de meses eis que retorno...e como esquivar-me de tal falta? A de abandonar à própria sorte um blog após seu primeiro post, de fato, se não há meios de desculpar-me, prometo passear com maior frequência nesse campo que eu própria me propus a cultivar e no entanto, após arrendar o terreno, lancei-o no esquecimento.
E por que o retorno? Porque nos últimos tempos estive a afiar o meu discurso, achei bons companheiros de combate e isto despertou novamente o desejo de escrever, até tracei uns rabiscos aos quais ousadamente chamei de poema, os postarei em um futuro próximo.
Saudações!
E por que o retorno? Porque nos últimos tempos estive a afiar o meu discurso, achei bons companheiros de combate e isto despertou novamente o desejo de escrever, até tracei uns rabiscos aos quais ousadamente chamei de poema, os postarei em um futuro próximo.
Saudações!
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