A vizinha do apartamento do andar de baixo já tinha ligado para o síndico 4 vezes! Não aguentava mais ouvir a gritaria que vinha do 216. Um inferno. Enquanto o casal do 216 se acusava, gritavam um com outro, esmurravam a parede e chutavam almofadas. Ainda não tinha partido pra porrada porque sobrara algum vestígio de respeito, mas estavam a beira disso.
Ela desenterrava as brigas dos primeiros meses de namoro, não havia frases que não começassem com "Você lembra aquela vez...?", e ele passava as mãos no cabelo nervoso, a ponto de arracar de si mesmo os cabelos da têmpora. Por fim ele disse que não dava mais, que a amava muito, mas que não era só de amor que se construia um relacionamento, que havia outros fatores...
_ O que foi? Agora você vai me dizer que eu não sou boa de cama, é isso?
_ Nossa! Como você é histérica, não entende nada nunca, não é?
_ Ah...agora sou burra? Não entendo nada?!
Tentava enxugar as lágrimas que escorriam pelo rosto.
_ Chega! É ínutil, vou pegar minhas coisas, tô indo embora. Vou pra casa da minha mãe, e acho melhor a gente não se falar por agora, é melhor esperar as coisas esfriarem.
_ Falou em frio é com você mesmo.
_ Sem sarcasmos, não vamos nos machucar mais.
Foi até a cômoda, pegou as roupas que mais usava, enfiou tudo na mochila de acampar, mais alguns pares de tênis, foi buscar a escova de dentes no banheiro. Ela vai atrás dele.
_ André, não faz assim, vamos conversar, a gente pode se acertar - tentou sorrir - afinal de contas, quem não briga? Não é mesmo?
Ele pega as últimas coisas, anda pelo apartamento para conferir se não esqueceu nada muito importante.
_ Tchau - beija-lhe a testa -, a gente pode ser feliz ainda. Mesmo que sozinhos, talvez apenas sozinhos.
Fecha a porta deixando a chave no aparador. Ela enconsta-se na porta, chora copiosamente, escorrega até o chão, fica lá por alguns minutos, horas talvez. Se levanta, pega um vinho que já estava aberto na geladeira, liga o note. Entra no Amor de papelão e passa um longo tempo lendo, enquanto acaba com a garrafa ao lado.
Com o rosto já seco, a queixo apoiado na mão, termina de ler o último post.
_ Não derramo nem mais uma lágrima, aquele canalha nunca me mereceu! Nunca escreveu um recadinho desses pra mim, nem em papelão, guardanapo, nem nada!
Procura o celular entre as almofadas.
_Alô? Carlos? É...faz tempo...